Número total de visualizações de páginas

terça-feira, 6 de maio de 2014

Mitificação do Herói

                         O Herói  n'Os Lusíadas e na Mensagem


*        Na Mensagem, a história de Portugal obedece a um destino maior do que os próprios destinos que a servem, o destino dos heróis.

*        Ambos os poemas épicos são poemas da ausência – porque cantam “o que foi” (Lusíadas) e o “que pode vir a ser” (Mensagem).

*        Em Camões é mais forte o sentido viril, de ímpeto de realizar, e em Pessoa é predominante o sentido simbólico, de revelar mistérios.

*        Camões, que vê o Império ainda vivo, exalta os heróis para a ação. Pessoa já não tem esperança no Império Material, no Império feito de terras e ouro, mas espera no futuro um Império Espiritual, de cultura e almas, que contém em si heróis de estirpe diferente, homens de outra vontade e erudição.


*      Em Camões, está no mesmo plano a memória e a esperança. Em Pessoa  a esperança  tornou-se  utopia.

*        Os heróis de Camões guiam-se pela bravura, pela missão de fé, pelo risco e pela aventura. São de carne viva. Na obra de Pessoa, os heróis são símbolos, espectros. São conscientes da derrota de ter e perder, revelam um Império já diferente, um Império Imaterial. Em essência os heróis da Mensagem têm uma “atitude contemplativa e expectante”, porque o Império já se cumpriu e agora resta a busca de uma “Índia que não há”. A Mensagem, ocultista, aponta a utopia, que em verdade nunca se cumpre e sempre permanece um horizonte. Em contraste com o realismo d’ Os Lusíadas, o elogio do herói na Mensagem é obscuro e simbólico. Redunda num – usando palavras de Prado Coelho – “elogio da loucura”, ao menos a loucura saudável, a loucura que nos salva de só viver sem pensar. Na Mensagem, Portugal é um instrumento de Deus, a História pátria obedece a um plano oculto, os heróis cumprem um destino que os ultrapassa.

*        Camões exorta um D. Sebastião ainda vivo, ciente que está de um Império que embora em perigo pode ainda sobreviver e renovar-se, enquanto que Pessoa exorta um D. Sebastião morto, feito já mito e esperança.

*        Enquanto Os Lusíadas são a exortação pura, do D. Sebastião presente, da esperança na renovação do Império decadente, a Mensagem é a exortação do mito Sebastianista, do rei morto e agora feito apenas futuro. De facto, Pessoa na Mensagem analisa do mito, o mito extirpado de qualquer vestimenta material e humana.

*        Para Pessoa, o Sebastianismo é a religião nacional, fundada num mito que nos é familiar. O encoberto, figura agora mítica, por encarnar num redentor que se espera. Que Império era este que ainda se esperava, mas que nunca se concretizava? É o Império Espiritual, o Império que não da carne, mas do espírito. Parece descobrir-se que afinal, a busca do Quinto Império, é a própria busca do superior patamar da alma portuguesa. A Mensagem é marcada por um tom messiânico, a profetizar a renovada grandeza da pátria, mediante a instauração do Quinto Império.

*        O Sebastião de Camões é viril e aventureiro, à moda das histórias de cavalaria da época. O Sebastião de Pessoa é já o mito, despido de vestes humanas, humilhado. Há esperança nos Lusíadas, utopia na Mensagem. O que importa na Mensagem é desenvolver um pensamento, uma ordem de pensar o futuro em função do passado.

*        Devemos ver as duas grandes obras da literatura poética portuguesa, Lusíadas e Mensagem, como obras situadas no início e no terminus do grande processo de dissolução do Império.


segunda-feira, 5 de maio de 2014

MENSAGEM

Este pequeno livro constituído por 44 poemas, possui uma essência épica e encontra-se dividido em 3 partes distintas: BRASÃO, MAR PORTUGUÊS E ENCOBERTO.

   O desafio lançado por Pessoa revela a sua insatisfação com o tempo presente que se vivia em Portugal e de forma megalómana e mística sente-se o arauto de um sonho quase utópico.

Estrutura formal e simbólica de Mensagem

Mensagem é a expressão poética dos mitos – não se trata de uma narrativa sobre os grandes feitos dos portugueses no passado, como em Os Lusíadas, mas sim, de um cantar de um Império de teor espiritual, da construção de uma supra-nação, através da ligação ocidente/oriente: não são os factos históricos propriamente ditos sobre os nossos reis que mais importam; são sim as suas atitudes e o que eles representam, sendo o assunto de Mensagem a essência de Portugal e a sua missão a cumprir. Daí se interpretem as figuras dos reis nos poemas de Mensagem como heróis mas mais que isso, como símbolos, de diferentes significados.

Integração de Mensagem no universo poético Pessoano:

Integra-se na corrente modernista, transmitindo uma visão épico-lírica do destino português, nela se salientando o Sebastianismo, o Mito do Encoberto e o V Império.


O poema começa com uma expressão latina ("Bendito o Senhor Nosso Deus que nos deu o sinal"), anunciando logo o sentido messiânico e simbólico.
Cada uma das três partes do poema inicia-se também com uma expressão latina.

1ª Parte – BRASÃO- Bellum sine Bello ( guerra sem guerra): o princípio da nacionalidade (em que fundadores e antepassados criaram a pátria). Sugere pelo jogo dos oxímoros um espaço que, no início, tinha de ser conquistado, pois fazia parte de um desígnio.
Remete também para um tempo heráldico. Esta 1ª parte está subdividida em cinco outras partes correspondentes ao estudo heráldico do escudo ou brasão português: os campos; os castelos, as quinas; a coroa; o timbre.
Faz a valorização dos predestinados que construíram o país. Refere as mães dos fundadores como " antigo seio do império" ou "humano ventre do Império".

2ª Parte- Mar Português- Possessio maris ( posse do mar): traduz o domínio dos mares e a expansão. Aqui, o poeta apresenta a sua visão messiânica da História, onde o sopro criador do sonho implica Deus como causa primeira, o Homem como agente intermediário e a obra como efeito.
Nesta parte, pretende-se simbolizar a essência do ideal de ser português vocacionado para o mar e para o sonho.

3ª Parte- O Encoberto- Pax in excelsis ( paz nos céus): Marcará o Quinto Império. É a mais assumidamente messiânica e sebastianista. O rei sonhador é agora o encoberto, aquele que virá, segundo o Bandarra e o Padre António Vieira, a fazer de novo a Hora, pois o atual Império encontra-se moribundo. mostra a fé que a morte contenha em si o gérmen da ressureição.
O poema termina com um Valete Frates ( felicidades, irmãos), acreditando num desígnio de um reino de fraternidade, graças ao Quinto Império, cujo espírito será moral e civilizacional.


Fernando Pessoa acreditava que, através dos seus textos, poderia despertar as consciências e fazê-las acreditar e desejar a grandeza outrora vivenciada. Espera poder contribuir para o reerguer da Pátria, relembrando, nas 1ª e 2ª partes da Mensagem, o passado histórico grandioso e anunciando a vinda do Encoberto (3ª parte), na figura mítica de D.Sebastião, que anunciaria o advento do Quinto Império.

            Preconizava para Portugal a construção de um novo império, espiritual, capaz de elevar os Portugueses ao lugar de destaque que outrora ocuparam a nível mundial. Esta projeção ficar-se-ia a dever a um “poeta ou poetas supremos” que, pela sua genialidade, colocariam Portugal, um país culturalmente evoluído, como líder de todos os outros.

            Na realidade, Fernando Pessoa antevê a possibilidade da supremacia de Portugal, não em termos materiais, como no tempo de Camões, mas em termos espirituais É nesta nova concepção de Império que assenta o carácter simbólico e mítico que enforma a epopeia pessoana e que, inevitavelmente, destacará a figura deste superpoeta, em detrimento da de Camões.

Pessoa identifica-se com os heróis da Mensagem ou neles se desdobra num processo lírico-dramático. O amor da pátria converte-se numa atitude metafísica, definivel pela decepção do real, por uma loucura consciente. Revivendo a fé no Quinto Império, Pessoa reinventou um razão de ser, um destino para fugir a um quotidiano
absurdo.
           O assunto da Mensagem é a essência de Portugal e a sua missão por cumprir. Portugal é reduzido a um pensamento que descarna e espectraliza as personagens da história nacional.
          A Mensagem é o sonho de um império sem fronteiras nem ocaso. A viagem real é metamorfoseada na busca do “porto sempre por achar”.