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segunda-feira, 18 de abril de 2016

Felizmente Há Luar! - Mecanismos de Distanciação


  • Brecht considera que o teatro deve tomar como ponto de partida a realidade envolvente, denunciando as injustiças sociais e procurando criar uma consciência política no espectador que o leve a intervir socialmente. 
  •  Por isso faz apelo constante ao espírito crítico e de análise do espectador, levando-o a uma maior consciencialização que passa pela sua capacidade de demonstrar racionalmente as técnicas de fabricação da ilusão que a estrutura dramática implica.
  • .A ruptura com a conceção tradicional da essência do teatro é evidente: o drama já não se destina criar o terror e a piedade, isto é, já, não é a função catártica, purificadora, realizada através das emoções, que está em causa, pela identificação do espectador com o herói da peça, mas a capacidade crítica e analítica de quem observa. Brecht pretendia substituir sentir por pensar. 


Distanciação: mecanismos

Para conseguir o objetivo de formar um espectador novo, crítico e interveniente na sociedade, que não se limite a identificar-se com situações ou personagens, mas que tome partido, Brecht utiliza um conjunto de técnicas que criam o que ele designa por efeito de distanciação
Distanciar é fazer com que o espectador não se identifique com as situações que visualiza, se sinta um estranho, e isso lhe permita, através da consciência crítica, perceber que pode ser agente de intervenção e mudança.

A distanciação é assim o cerne de um teatro didáctico. Ela tem lugar a vários níveis: 

fábula; 
personagens;
cenário;
gestus;
iluminação; 
som.

  
Fábula-  a peça deve abordar um tema histórico que funcione como metáfora. A adaptação de um tema metafórico é um dos processos usados para provocar a distanciação.
A realidade representada funciona como metáfora da realidade política em Portugal ao tempo da escrita da peça. 
A escolha de um exemplo real da nossa História, serve de exemplo, para reflexão, e, simultaneamente, contribui para a transformação da realidade contestada. 

Personagens- no seu processo de atuar em palco, devem distanciar-se do que representam, permitindo ao espectador perceber que estão ao serviço de uma ideia, de uma denúncia. Elas procedem de modo a não contribuir para que o espectador as confunda com o que representam: a personagem deve ser entendida como porta-voz de uma consciência, cabendo-lhe fazer com que o público não se identifique consigo, antes compreenda que ela mais não é que uma persona, uma máscara, um processo de denúncia. 

A trilogia do poder, Principal Sousa, D. Miguel e Beresford, é um conjunto de personagens que atua de modo a que o espectador consiga desmontar as engrenagens de interligação entre os poderes religioso, político e militar.


 Cenário- muito pouco caracterizado, apenas são referenciados alguns elementos que nos remetem para determinados espaços sociais.
    As três cadeiras "pesadas e ricas com aparência de trono" ilustram as três faces do poder. O "caixote" no qual se senta uma "velha"  caracteriza os oprimidos.

Gestus- Promove a distanciação na medida em que abarca um conjunto de atitudes que aponta para a relação do indivíduo com o mundo que o rodeia, podendo servir para indicar um posicionamento de classe.
O 1.º Popular ora macaqueia os modos de um fidalgo, ora "desfaz o gesto com violência" para denunciar que ali ninguém tem relógio, compreendendo-se que assim é porque as condições socio-económicas não o permitem. 

 Iluminação- contribui para o efeito de distanciação  através do contraste luz/sombra, pretendendo, deste modo, que o espectador compreenda os diferentes momentos cénicos; revela as personagens em cena sublinhando-lhes as ações e as palavras; distingue espaços; destaca elementos cénicos; evidencia a carga semântica e metafórica da luz e da sombra.
  
"Surge, a meio do palco, intensamente iluminada (...) Matilde de Meio" (p. 83). 
Ausência da luz 
"Apagam-se todas as luzes. As personagens ficam na penumbra agitando os braços e erguendo bandeiras no ar" (p. 74). 

Som- A música, o som de fundo, o ruído dos tambores contribuem para a distanciação porque apresentam uma função intimidatória: medo; repressão.

"Começa a ouvir-se, ao longe, o ruído dos tambores" (p. 17). 
"Ouve-se ao longe uma fanfarra que vai num crescendo de intensidade até cair o pano" (p. 140).   













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