Em Pessoa ortónimo, a infância é entendida como um tempo mítico do bem, da felicidade e da inconsciência. Nela permanecem sempre vivos a família e os lugares, a segurança e o aconchego. A inconsciência de que todo esse bem é irrecuperável, alimenta a nostalgia pela infância, um tempo perdido que serve sobretudo para acentuar a negatividade do presente. Ao mesmo tempo que gostava de ter a infância das crianças que brincam, sente a saudade de uma ternura que lhe passou ao lado. A temática do regresso à infância associa-se igualmente ao tempo e à degradação. Em consequência da brevidade da vida e da passagem dos dias, Pessoa busca múltiplas emoções e abraça sonhos impossíveis, mas acaba “sem alegria nem aspirações”, inquieto, só e ansioso;
O passado pesa “como a realidade de nada” e o futuro “como a possibilidade de tudo”. O tempo é para Pessoa um factor de desagregação na medida em que tudo é breve e efémero; Procura superar a angústia existencial através da evocação da infância e de saudade desse tempo feliz. A infância representa-se como refúgio para combater a insatisfação com o presente e incapacidade de viver o presente em plenitude.
A nostalgia de um estado inocente em que o eu ainda não se tinha desdobrado em eu reflexivo está representada no símbolo da infância. A infância é a inconsciência, o sonho, a felicidade longínqua, uma idade perdida e remota que possivelmente nunca existiu a não ser como reminiscência.
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