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domingo, 30 de outubro de 2022
Mestre Caeiro
Se tivermos em mente os três princípios básicos do "sensacionismo'', tal como Pessoa os formulou:
"1. Todo objeto é uma sensação nossa; 2. Toda arte é a conversão de uma sensação em objeto;3. Portanto, toda arte é a conversão de uma sensação numa outra sensação.''
Podemos facilmente verificar, pela leitura dos poemas de Caeiro, que ele é, dentre os heterónimos, aquele que representa a postura mais radical face a esses postulados pessoanos: para o mestre, o que importa é vivenciar o mundo, sem peias e máscaras sígnicas, em toda a sua multiplicidade sensacionista.
É por este motivo que, repetidamente, Caeiro, nos seus poemas, insiste naquilo que ele mesmo chama de "aprendizagem de desaprender'', ou seja, o homem deve aprender a não pensar, a silenciar a mente, libertando-se assim de todos os padrões, modelos, máscaras e pseudo-certezas ideológicas, culturais, sígnicas enfim, que desde cedo lhe foram impostas, para dedicar-se só e simplesmente à revolucionária e reveladora aventura do contato direto e sem mediações com a realidade concreta, palpável, que nos cerca e de que fazemos parte.
A verdadeira vida para Caeiro reduz-se, deste modo, ao "puro sentir'', sendo o sentimento da "visão'' o mais relevante de todos, por ser o que nos coloca em relação mais estreita e integral com o mundo objetivo:
"O essencial é saber ver, Saber ver sem estar a pensar, Saber ver quando se vê, E nem pensar quando se vê, Nem ver quando se pensa.''
Caeiro procurava, diariamente, exercitar o que ele mesmo chamou de a "perversa ciência de ver''.
Em decorrência dessa sua postura face à vida e dessa prática sensacionista, nasce uma estranha poesia empenhada em fazer a crítica mais radical da linguagem, da cultura, das ideologias e, paradoxalmente, da própria atividade poética, via negação/rejeição/recusa de qualquer tipo de pensamento.
A poesia de Caeiro é, neste sentido, uma curiosa poesia da anti-poesia, feita com o objetivo específico de pôr em xeque todas as máscaras sígnicas (palavras, conceitos, pensamentos, ideologias, religiões, arte) com que estamos habituados a "vestir'' a realidade, esquecidos de que ela simplesmente "é'' e vale por si mesma, e de que a única experiência que vale a pena é a de uma espécie de silêncio sígnico total (o homem, neste caso, libertar-se-ia do poder constrangedor de todo e qualquer signo, deixando, portanto, de atribuir significados ao mundo), o único caminho que, segundo Caeiro, nos possibilitaria a visão e, consequentemente, o conhecimento do real em toda a sua verdade, enquanto pura presença e pura existência:
"A espantosa realidade das coisas É a minha descoberta de todos os dias. Cada coisa é o que é, E é difícil explicar a alguém quanto isso me alegra, E quanto isso me basta.''
quarta-feira, 5 de outubro de 2022
Complemento do nome e Modificadores
A diferença basilar entre complementos e modificadores reside no facto de os
primeiros serem selecionados por uma palavra, completando-lhe o sentido,
enquanto os segundos são constituintes que não são selecionados, introduzindo na
frase informações adicionais.
Os complementos do nome são constituintes
essenciais para que a realidade sobre a qual se pretende falar seja claramente
explicitada. Por exemplo, se utilizarmos o nome amigo, percebemos que este
necessita de um complemento para referir toda a realidade, pois um amigo é
sempre «amigo de alguém». Note-se, no entanto, que é possível utilizar estes
nomes que pedem complemento isoladamente, o que leva a que a frase fique com um
sentido mais vago ou genérico, como se observa pelo confronto entre (1) e (2):
(1) «O amigo do Rui toca guitarra.»
(2) «O amigo toca guitarra.» Embora não seja
possível elaborar uma listagem completa dos nomes que pedem complemento, é
possível identificar alguns que normalmente se constroem com este constituinte:
(i) nomes deverbais: nomes formados a partir de verbos que se constroem com
complemento, estrutura que o nome mantém: «Destruir uma casa» - «A destruição da
casa»;
(ii) nomes fragmentadores: «uma fatia de…» ou «uma parte de…»;
(iv) nomes
argumentais: «autor de…», «ajuda de…», «a hipótese de…»;
(v) nomes de
parentesco: «pai de…», «filho de…»;' '
(vi) nomes de estados psicológicos: «medo
de…», «alegria de…»;
(vii) nomes que denotam obras de arte: «livro de…», «filme
de…», «capítulo de…»;
(viii) nomes pictóricos, relacionados com imagem:
«fotografia de…», «pintura de…»;
(ix) nome de matéria: «mesa de vidro», «fato de
seda»1
Os modificadores, por seu turno, podem incidir sobre o nome, sobre o
grupo verbal ou sobre a frase, introduzindo na frase informações sobre
circunstâncias variadas. Os modificadores da frase incidem sobre toda a frase e
podem ser:
(i) um advérbio: «Felizmente, hoje não vai chover.»
(ii) uma oração:
«Embora não esteja a chover, vou ficar em casa.»
Os modificadores do grupo
verbal incidem sobre o grupo verbal e podem ser:
(i) um advérbio: «Ele correu
velozmente.»
(ii) um grupo preposicional: «Acabei a corrida com o auxílio do
João.»
(iii) uma oração: «Estudou para passar no exame.»
Os modificadores do
nome incidem sobre o nome e podem, entre outras possibilidades, ser:
(i) um
adjetivo: «Uma rapariga loura»' '
(ii) uma oração subordinada adjetiva relativa:
«A rapariga que conheci no sábado»
(iii) um sintagma preposicional: «A escola da
minha amiga»
Os modificadores de nome podem ser de dois tipos:
(i) restritivos:
incidem sobre o nome restringindo o seu significado e surgem ligados diretamente
ao nome: «a rapariga morena», «o livro que leste no sábado»;
(ii) apositivos:
são expressões destacadas por vírgulas que incidem sobre o nome fornecendo
informações variadas sobre este: «D. Dinis, rei de Portugal, escreveu esta
cantiga.», «D. Dinis, que se destacou como poeta, nasceu em 1261.»
' in
Ciberdúvidas da Língua Portuguesa,
https://ciberduvidas.iscte-iul.pt/consultorio/perguntas/complemento-do-nome-vs-modificador/35316
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